A formação de um novo povoamento florestal a partir da condução da brotação das cepas da rotação anterior, chamada de talhadia, é um sistema amplamente utilizado no mundo.
No Brasil foi muito utilizado até a década de 90, quando houve o advento da clonagem e os programas de melhoramento genético começaram a entregar novos materiais, mais produtivos e tolerantes a pragas e doenças, com uma velocidade nunca vista antes. Isso fez com que a talhadia entrasse em desuso, pois após sete anos materiais genéticos mais produtivos já estavam disponíveis, justificando a reforma da área.
Nos últimos 20 anos a talhadia tem sido utilizada principalmente em momentos de crise, devido a seu menor custo. A crise econômica de 2008 fez o percentual de área conduzida por talhadia no Brasil saltar 5% em 2008 para 25% em 2009.
Talhadia: boa ou ruim?
Apesar de ser uma importante estratégia, em momentos de dificuldades financeiras é comum que vastas áreas sejam “deixadas para brotar” sem muito critério e/ou manejo. Talvez essa seja a razão pela qual, até hoje, atribuirmos menor produtividade para áreas de talhadia.
Nós, da Geplant, vemos a talhadia como uma importante ferramenta para a sustentabilidade e a competitividade da silvicultura brasileira. Afinal, já atingimos um patamar de produtividade perto do limite biológica e os programas de melhoramento genético já não entregam novos materiais na velocidade da década de 90.
Mesmo tendo surgido novos clones, ou superclones, como alguns gostam de chamar, poucos batem, na escala do projeto, os “já ultrapassados” H13, 2361, I144 – só para ficar entre os mais conhecidos.
Diversos estudos já demonstraram que o potencial produtivo da talhadia é o mesmo da primeira rotação. Gonçalves et al. (2014), avaliando a produtividade de 265 parcelas de inventário em primeira e segunda rotação, observaram que o principal fator que afetou a produtividade foi a precipitação acumulada, ou seja, a rotação que recebeu o maior volume de chuva foi a mais produtiva.
Recentemente avaliamos uma área com três rotações em Itatinga – SP que foi plantada em 2000. Essa área foi colhida em 2007 (R1) com IMA de 43 m3/ha/ano colhida novamente (R2) em 2014 com IMA de 53 m3/ha/ano e chegou em 2021 (R3) com IMA de 56 m3/ha/ano. Isso já havia sido notado, inclusive, pelo Dr. Edmundo Navarro de Andrade que escreveu em seu livro O Eucalipto (1961)
“É difícil determinar durante quanto tempo terão os eucaliptos a possibilidade de ser explorados em talhadia, mas possuímos já elementos para asseverar que, após quatro cortes sucessivos, os eucaliptos têm brotado bem, nada denotando qualquer enfraquecimento ou diminuição de vitalidade da touça”.
Potencial produtivo da talhadia
Dessa forma a questão que fica é: como garantir que a talhadia expresse seu potencial produtivo? Sobre isso, podemos elencar dois pontos principais.
Primeiro é a seleção das áreas a serem conduzidas e segundo é a aplicação de técnicas silviculturas adequadas. Nem todas as áreas são passíveis de serem conduzidas por talhadia sem que haja prejuízos de produtividade. Diversos critérios para seleção das áreas elegíveis para talhadia são propostos, e destacamos dois deles como principais.
Adequação do genótipo ao ambiente
Talhadia significa manter a mesma genética. Dessa forma, essa tem que ser adequada ao ambiente. Isso pode ser avaliado pela performance da rotação anterior, incidência de pragas e doenças e a inexistência de materiais mais adequados.
Deve-se tomar cuidado em analisar a produtividade puramente, pois essa pode ser afetada pelas condições climáticas atípicas ou alguma falha manejo, e não necessariamente da adequação genética.
Sobrevivência das cepas
A expressão do potencial produtivo depende de um stand ajustado ao ambiente. Dessa forma, áreas com baixa sobrevivência das cepas deve ser preferencialmente reformadas.
Vamos a um exercício financeiro, considerando o valor nominal, assumindo que não há perda de produtividade com a talhadia e que o custo da talhadia é 50% do custo de formação da floresta.
Considerem uma área com custo de R$ 8.000/ha, produtividade média de 45 m3/ha/ano e ciclo de 7 anos:
- No final do ciclo, o custo caixa da madeira é de R$ 25,40 por m3
- Se essa área for conduzida por talhadia, considerando os 14 anos, o custo caixa será de R$ 19,05 por m3.
- Se for possível conduzi-la por talhadia pela 3º rotação, ao final dos 21 anos o custo caixa será de R$ 16,93 por m3.
Obviamente não serão todas as áreas que terão potencial de condução por três rotações, mas fica claro que é possível reduzir o custo caixa da madeira em até 33%, ao menos em parte da área.
Fizemos uma simulação, de um projeto de 70 mil ha que colhe 10 mil ha/ano e consegue levar 80% da área para segunda rotação e 40% para terceira rotação. Isso resulta em um custo caixa da madeira 27 % inferior, quando comparado a apenas uma rotação (somente reforma).
Além da redução de custo, o sistema de talhadia resulta em menos intervenções na área, o que contribui para a conservação do solo, e reduz a demanda de insumos.
O sistema radicular mais amplo garante maior exploração do solo e consequentemente maior eficiência na absorção de nutrientes. Entretanto, os tocos de maiores dimensões podem vir a ser um problema, dependendo de sistema de colheita.
Acreditamos que a talhadia é uma importante ferramenta de manejo para garantir a sustentabilidade dos projetos florestais. Se for adequadamente utilizada, com um bom planejamento, não há prejuízo em produtividade e resulta em ganhos financeiros e ambientais.
Fica o questionamento: por que não por mais de duas rotações?